Título emocionante de Federer coroa envelhecimento exemplar

DANIEL E. DE CASTRO

Seria difícil imaginar um roteiro melhor e mais dramático para a 18ª conquista de Grand Slam de Roger Federer. Aos 35 anos, contra o maior rival, em cinco sets e num ponto definido após o desafio.

É um daqueles dias em que tudo parece fazer sentido: os mais de quatro anos de espera desde o troféu de Wimbledon-2012, os seis meses parados por lesão no joelho, a dúvida se a bola havia ido fora que fez com que o Aberto da Austrália tivesse o protagonismo da tecnologia em seu desfecho.

Como não se emocionar com a alegria de criança do campeão? Nos últimos anos, era em tom sarcástico que falávamos sobre a sua “decadência”. Parecia impossível bater Novak Djokovic em cinco sets, mas ele sempre esteve por ali: fez oito semifinais e decisões de Slams desde então. Focado, decidiu enfrentar a maior lesão da carreira e retornar mesmo após ter conquistado quase tudo o que podia.

O carinho do público só aumentou, e Federer passou a ser o favorito sentimental de todo torneio. Em Melbourne, as entrevistas com Jim Courier após as partidas transformaram-se em longos bate-papos. A familiaridade de nós, mortais, com o suíço é tamanha que, ao ver suas declarações, dá vontade de perguntar: “Como vai a Mirka? E as crianças, estão bem?”.

Dentro de quadra, suas exibições despertam inveja. Quem envelhece tão bem? O físico pode não ser o mesmo, mas a técnica e a classe não o deixaram.

Em 2006, no célebre ensaio “Federer como experiência religiosa”, o escritor David Foster Wallace definiu “Momentos Federer” como “ocasiões em que, assistindo ao jovem suíço jogar, a mandíbula despenca, os olhos saltam para fora e os sons produzidos fazem o cônjuge aparecer na sala para ver se você está passando bem”.

Com exceção do “jovem”, a definição segue atual. A carreira inteira do maior vencedor de Slams em todos os tempos é um “Momento Federer”.

Diante de Rafael Nadal neste domingo (29), ele espantou fantasmas do passado. Pressionado, deu as velhas madeiradas, mas também foi agressivo e buscou a linha, com saldo positivo: 73 bolas vencedoras e 57 erros não forçados. No quinto set, quando tudo indicava o contrário, o suíço foi mais forte mentalmente que o espanhol.

Federer vai sacar para o campeonato. Ah, que saudades de ouvir isso. Federer tem o match point. Meu Deus, não acredito que estou ouvindo isso. Federer é campeão do Aberto da Austrália. Que maravilhoso ouvir isso.

Não se sabe como será o amanhã do suíço, que retorna ao top 10, mas por enquanto não importa. Obrigado por hoje. Obrigado por tudo, Roger.