Com início sofrido de carreira, Rogerinho chega ao auge de forma inesperada
Rogério Dutra Silva é direto ao responder se imaginava viver a melhor fase da carreira aos 33 anos: “Não esperava”. A lista de motivos para a descrença é longa, mas Rogerinho, como é conhecido, trata o passado com sobriedade. “Não quero passar como chorão”, justifica.
Das primeiras rebatidas à vida de profissional, o paulista trilhou um caminho diferente do percorrido pela maioria de seus pares. Na infância, para ser autorizado a frequentar o clube em que o pai era professor de tênis e praticar o esporte, ele precisava ajudar na função de pegador de bola.
Anos mais tarde, quando os gastos cresceram, seus pais suaram para contornar a falta de eventos juvenis no Brasil e permitir que o filho disputasse torneios na Europa.
Na época, ele saía do país com pouco dinheiro e sob muita pressão por bons resultados. “Às vezes ia e ficava três meses, mas outras vezes ficava três semanas, não ia bem nos torneios e tinha que voltar sem um real no bolso”, relembra o atleta.
Consta no site da ATP (Associação dos Tenistas Profissionais) que Rogerinho é profissional desde 2003. A ficha não revela, porém, os “trabalhos extras” feitos por ele, dentro e fora do circuito.
“Em alguns anos não me dediquei só ao profissional. Tive que dar aulas, fui pegador de bola, já encordoei raquete em torneios para ganhar dinheiro para comer”, relata.
No início da carreira, em um campeonato profissional no México, o brasileiro passou por uma situação inusitada após seu tênis estragar durante a competição.
“Não tinha dinheiro para comprar outro e achei uma promoção de um tênis com as travas grandes. Eu começava a pisar na quadra e furava ela inteira”, conta. Rogerinho venceu aquela partida, mas, com medo de ser desclassificado, conseguiu um calçado emprestado para o jogo seguinte.
AUGE INESPERADO
A partir de segunda (3), em Wimbledon, o 68º colocado do ranking disputará seu sexto Grand Slam consecutivo, feito inédito para ele. O torneio na grama é o único dos quatro mais importantes do esporte em que Rogerinho nunca venceu um duelo.
Das cinco vitórias que acumula nos demais, o atleta precisou jogar cinco sets em quatro ocasiões.
Ele garante, porém, que o drama não é proposital: “Preferia ganhar em três [sets], mas, se continuar ganhando em cinco está bom, viu [risos]. Não precisava ter tanta emoção. As pessoas me falam: “Meu, você quase me matou do coração’”.
Uma dos méritos de Rogerinho, reconhecido pelos adversários, é não entregar pontos com facilidade. “Para poder jogar tênis tive que batalhar muito. Quando entro na quadra penso que aquele pode ser meu último ponto e tento deixar tudo nela”, afirma.
Ele reconhece que os desvios que precisou fazer durante a carreira limitaram o desenvolvimento de aspectos técnicos do seu jogo, mas comemora o momento atual.
“O pessoal vê que eu fui evoluindo muito no decorrer dos anos. Era um jogador limitado e fui procurando meios para ir melhorando taticamente, mentalmente e fisicamente”, diz.
Em 2015, o paulista também vivia boa fase quando teve lesões no joelho e despencou no ranking. O tempo parado coincidiu com o nascimento de Luiza, sua filha, fato que para ele trouxe amadurecimento.
No ano passado, após mudanças na rotina de preparação física —hoje trabalha com o argentino Carlos Perez—, o brasileiro ganhou massa muscular e potência, algo que considera fundamental para a sua evolução em quadra.
Se o auge tardio gerou reconhecimento, o mesmo ainda não se pode dizer sobre novos patrocínios. Sem local fixo para treinamentos, ele costuma praticar na Argentina (país também do seu treinador, Andres Schneiter) ou em Santa Bárbara d’Oeste, no interior de São Paulo, quando está fora de competições.
Rogerinho sabe que a trajetória percorrida é digna de admiração, mas evita colocar-se como um modelo. “Várias pessoas podem levar isso para o lado positivo, mas tomara que não precisem copiar muitas coisas que precisei fazer para jogar. Foi muita loucura, mas fico feliz que está dando frutos”, afirma.